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MAPUCHES
um povo contra o estado

Um documentário de Carlos Pronzato


Jornada Internacional de Cinema da Bahia

9 a 16 de setembro de 2010

Salvador – Bahia – Brasil

http://www.jornadabahia.com/2010/37filmes.html


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MAPUCHES, UM POVO CONTRA O ESTADO (60 min./ 2010)

Com legendas em português



Os Mapuches (em mapudungum “gente da terra”) são uma nação da região centro-sul do Chile e sudoeste da Argentina. Desde a conquista, os espanhóis lutaram duramente para subjugá-los, mas não conseguiram. Atualmente, o povo mapuche continua reclamando seus territórios que foram submetidos ao domínio do Chile e da Argentina em finais do século XIX. A principal reivindicação mapuche é a recuperação e auto-gestão de seus territórios ancestrais frente a invasão das transnacionais protegidas pelo Estado, ou seja, a autodeterminação de seus povo, direito amparado pela jurisprudência internacional (Convênio 169 da OIT). Este documentário aborda o conflito do Estado com o povo Mapuche no lado chileno do Walmapu (território mapuche). Vozes de diversas organizações e setores da sociedade chilena denunciam a continuidade das perseguições políticas e crimes do Estado contra o povo mapuche.



O documentário foi apresentado em julho deste ano na Argentina em sessões de pré-estréia em Buenos Aires e La Plata e levado ao Chile por militantes da causa mapuche.



CATÁLOGO DE FILMES E LIVROS DE CARLOS PRONZATO: http://www.lamestizaaudiovisual.blogspot.com/







LINKS com informação sobre o tema mapuche:

http://www.mapuexpress.net/

http://www.azkintuwe.org/

http://www.vermelho.org.br/educacao/noticia.php?id_noticia=133353&id_secao=8

http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cat=10&cod=50403

http://www.diarioliberdade.org/index.php?option=com_content&view=article&id=5615:outro-preso-politico-mapuche-comeca-greve-de-fome&catid=285:direitos-nacionais-e-imperialismo&Itemid=187

:http://www.avkinpivkemapu.com.ar/index.php?option=com_content&task=view&id=1726&Itemid=3


Fotos: Ariel Olivares e Flekcha http://www.flekcha.blogspot.com/

Ainda Belo Monte

Em Manaus, James Cameron faz um apelo a Lula
Diretor afirmou que hidrelétrica de Belmonte 'vai destruir a vida das populações ribeirinhas'

Por Liege Albuquerque, da Agência Estado

27 de março de 2010 | 18h 13

O cineasta James Cameron, estrela do Fórum Internacional de Sustentabilidade, fez um apelo ao presidente Luis Inácio Lula da Silva em relação à construção da hidrelétrica de Belomonte. "A barragem vai destruir a vida das populações ribeirinhas. Eles são povos ameaçados como os Navi, mas não tem aquelas criaturas aladas para ajudar na luta", disse.

Cameron, que fez um sobrevoo sobre a floresta nos arredores de Manaus até o complexo de Anavilhanas, disse estar maravilhado com a floresta, mas descartou qualquer possibilidade de filmar fora de estúdios. "Talvez pense numa possibilidade de usar imagens da floresta em um documentário ou filme, mas não em fazer cenas dentro da mata".

Em seu discurso no Fórum, Cameron mostrou defesa engajada à proteção do meio-ambiente e disse querer ver seu filme mais recente como um ícone de defesa às florestas. "Avatar não é uma condenação à humanidade, mas um convite à ação".

Em sua visão, as mortes no Haiti não foram nada frente ao que vai acontecer com a humanidade com as mudanças climáticas nos próximos anos. "Só com os dois graus a mais na temperatura que o IPCC apontou para este século há pelo menos 42 espécies de plantas na Amazônia que não iriam sobreviver, além de comunidades ribeirinhas que devem desaparecer com a água dos rios de volume aumentado pelo degelo", destacou. "Estamos apenas em dúvida quanto ao quando, não ao se".

Pontuando sua fala com diversos elogios à gestão do governador Eduardo Braga (PMDB), "que administra o Estado brasileiro coma a floresta mais preservada", Cameron sugeriu que o mundo precisaria de seus "clones".

Não conheço nenhum outro lugar como o Brasil, onde o governo e as indústrias tenham essa preocupação ambiental, que é ainda maior no Amazonas". Mas, para o cineasta, são os países industrializados que deveriam se mobilizar para financiar a floresta em pé.

Pessoal

Segundo o cineasta, Avatar é seu filme mais pessoal. "Não fiz o filme para ganhar dinheiro, mas por algum motivo se tornou o filme mais visto da história. E acho que o sucesso significa que as pessoas estão despertando para este perigo".

Cameron fez analogias com a simbologia de seus filmes Avatar e Titanic. "Será que não estamos entre aqueles noventa segundos em que o marinheiro avista o iceberg e o desastre? E esse desastre vai atingir a todos porque precisamos ter claro que quando Titanic afundou a primeira e a quarta classe foram para o fundo".

Manifesto - estou sendo roubado

Manoel de Oliveira esteve em Belo Horizonte e referiu-se à questão indígena como principal arredo de emancipação da raça humana diante da crise ambiental e cultural que assola o planeta.


A aceitação da existência de uma arte legítima, de uma educação legítima, de uma “cultura legítima” já se mostrou uma atitude idealista catastrófica, por ser o resultado de um sacrfício mítico praticado pelos dominadores e representado como espetáculo artístico aos dominados num rito de expropriação, consagração e legitimação da partilha desigual das propriedades naturais e dos fluxos culturais disponíveis.

O ar da graça inspirado pela presença do ancião Manoel de Oliveira no sexto ciclo de Sentimentos do Mundo me despertou para um aspecto sobre as terras e territórios indígenas e quilombolas no Brasil bem como para o enfrentamento da questão pelas Ciencias Sociais.

Existe uma dominação linguística que discrimina a partir de um discurso da diversidade um arquétipo que na prática inferioriza as subjetividades dos individuos negros ou pertecentes aos povos originários do Brasil de modo a não reconhecê-los com capacidades iguais de intelecto e aptidões para a prática cultural no mundo modernamente civilizado.


Intermitência

Abaixo um bom texto acerca do cinema brasileiro analisado em termos do
modelo técnico-administrativo em operação hoje no Brasil. A exposição comparativa entre as realidades brasileira, estadunidense e africana fornece elementos preciosos para o debate político acerca da Nova Ancine. O Texto é de Felipe Macedo, diretor de Formação do CNC (Conselho Nacional de Cineclubes) e Presidente da Federação Paulista de Cineclubes, foi postado na lista da ABD pelo João Batista Pimentel. Reproduzo aqui na íntegra para que possamos fechar o verão sem nostalgias.




*O Modelo Brasileiro de Cinema*

*Um estrangeiro em nossas telas*

** Por Felipe Macedo

O cinema nacional foi expulso das telas do País no início da segunda década
do século passado, tornando-se definitivamente um turista acidental nas
praias do imaginário popular brasileiro.

Durante décadas, na nossa mentalidade colonizada, estimulada por ampla
propaganda e pela complacência quase absoluta das elites econômicas - e
mesmo da intelectualidade – a ausência pouco menos que total do cinema
brasileiro nas salas de exibição, e posteriormente nos lares, foi encarada
como “natural”, decorrente de nossas fraquezas atávicas.

Nos anos 30, com a sonorização, dizia-se que nosso idioma não ficava bem no
cinema. Nos tempos em que o musical e a comédia popular ganhavam espaço na
concorrência com o similar americano, logo ganhavam o estigma da
vulgaridade, identificada com a nossa (in)capacidade de criação, e eram
prontamente repudiados pela intelligentsia. Ou, ao contrário, quando
instigante, inovador, laureado em festivais do mundo todo, era elitista,
incompreensível ou… comunista. Houve tempo em que o som do cinema brasileiro
“não prestava” - os exibidores mantinham péssimas aparelhagens sonoras já
que o público não tinha que entender os diálogos, mas apenas ler as legendas
dos filmes falados em inglês. E ainda teve a época em que o nosso cinema era
só “sacanagem e pornografia”, rótulo curioso em tempos de censura feroz e
que se colava numa variadíssima gama de filmes, das comediazinhas eróticas
inspiradas no modelo italiano da época e até nas adaptações cinematográficas
de Nelson Rodrigues, Jorge Amado ou Mário de Andrade.

*A compreensão do modelo *

Dentro do cinema brasileiro, entre os cineastas e produtores, a compreensão
da sua própria condição esteve limitada, ao longo de todo esse tempo, pela
situação desesperadora em que sempre se encontrou. Tanto ou mais que outras
expressões culturais que se realizam no espaço econômico do mercado, sem
poder se estruturar industrialmente, o cinema brasileiro foi constrangido a
procurar sua salvação no financiamento episódico e irregular da produção. Da
“cavação” do começo do século até a renúncia fiscal de hoje, passando por
eventuais mecenas e períodos diversos de fomentos variados ou tímidas
reservas de mercado, mais heróico que oportunista, o cinema brasileiro
concentrou toda a sua energia, na maior parte do século 20, em arranjar
recursos para a produção. E identificou na questão do financiamento da
produção a problemática do cinema em nosso País.

Nos últimos anos, contudo, cresceu a consciência de que o processo econômico
do cinema só se realiza integralmente ao atingir o consumidor final, o
respeitável público. Vários elementos contribuíram para a valorização desse
“novo” enfoque, como os sucessos de exibição conseguidos pela Embrafilme,
impulsionados muitas vezes pela participação direta dos realizadores, por
volta dos anos 80. Mas foi principalmente o gritante encolhimento do mercado
exibidor que tornou evidente a impossibilidade de se pagar um filme sem ter
salas suficientes para exibi-lo. Ainda que não se deva desprezar a onda
privatizadora que acompanhou a redemocratização do País na formação dessa
nova consciência – com o fechamento da Embrafilme e o inferno collorido que
o cinema experimentou - ela não parece ter sido forte o suficiente, até
então, para alterar o modelo baseado exclusivamente no financiamento da
produção. Tanto que, depois de uma certa perplexidade, reconstituiu-se
basicamente o mesmo modelo de financiamento estatal, agora sob a forma de
renúncia fiscal.

Não, só muito recentemente começaram a surgir modelos de produção privados e
regulações de investimentos que realmente incorporam a noção fundamental da
exibição. Grosso modo, vêm-se essas iniciativas mais claramente com as
produções de grupos ligados à televisão, nas associações com os
distribuidores e, no plano financeiro, com o chamado “artigo 3º “e com os
funcines.

Ainda que se mantenha o financiamento da produção através de mecanismos de
renúncia fiscal (afinal, ninguém é de ferro), pode-se dizer que uma parte do
cinema no Brasil está centrando mais a sua compreensão na questão da
exibição. Do ponto de vista econômico – e em termos de público – já é o novo
modelo que responde por boa parte do desempenho do cinema brasileiro. Um
modelo que inclusive pretende prescindir totalmente de regulamentação
estatal, como ficou amplamente demonstrado na recente querela da Ancinav.

Mas será que o sucesso econômico e de público – e de “crítica”, se pensarmos
na inédita adesão da imprensa nos tempos que correm - provam o acerto do
modelo? Será que o cinema brasileiro chegou finalmente à maturidade e
conseguiu descobrir a fórmula mágica que lhe permite criar uma indústria
sólida, num jogo livre de mercado, e conquistar o público que, para muitos,
não gostava de cinema brasileiro?

Ou será que, como sempre, nossa capacidade de foco se limita apenas ao
primeiro plano da realidade e a milagrosa receita de solução não passa da
reprodução ideológica e colonizada de interesses econômicos que seguem
dominando nosso cinema? Mesmo com o generalizado desconforto que prodiga a
“estética de televisão”, que parece estar empobrecendo nosso cinema; ainda
que a imensa maioria da chamada classe cinematográfica tenha se manifestado
pela necessidade de controle e regulamentação do audiovisual, será que há
uma visão clara de onde está o erro essencial desse modelo? Existe alguma
outra proposta para o cinema brasileiro, que não seja o retorno à mera
repetição do apadrinhamento da produção?

*Paz de cemitério*

Há vários sofismas no raciocínio triunfante da fórmula “Motion Pictures
Association, Globo e parceiros”. De fato, o que ela consagra é uma solução
de compromisso: Hollywood “cede” uma parcela ínfima do nosso mercado em
troca do conformismo ou silêncio da parte brasileira que terá o privilégio
de ocupá-la. E oculta a questão realmente central do cinema no Brasil: a
distribuição.

Desde a reforma da Constituição, da chegada dos exibidores estrangeiros e
das salas multiplex, essa fórmula vem sendo vendida: reservar uma sala em
dez para o cinema brasileiro, mais ou menos 10% do mercado. Mas, claro, o
mercado é “livre”, tem anos que se pode chegar quase a 20% (desde que não se
repitam)! A fórmula parece grosseira…mente simples, mas tem aspectos
geniais.

Com a “concessão” desse espaço, o cinema brasileiro (na verdade, um ou dois
títulos entre dezenas de lançamentos) chega, em anos extraordinários, a
“bater recordes” de renda e público. A imprensa festeja. Com um mercado
assim acordado e definido, portanto paradoxalmente quase sem risco, novos
players entram no jogo: a televisão brasileira, agora produtora e a ardorosa
defensora dos valores nativos. E ela mesma festeja, no rádio, jornal e
televisão. Apaziguados os ânimos definitivamente, exorcizado o sentimento
antiamericano, as distribuidoras de Hollywood “se abrem” para alguns filmes
brasileiros (ainda que, como antigamente, só nas datas não reservadas para
filmes americanos, mesmo que os brasileiros façam maior renda) que
aparentemente não têm mais que lutar pra entrar nesse cercadinho de 10% da
área do cinema. Aliás, elas já os produzem, amparadas no famoso “artigo 3º”.
E até ao Oscar - o Kikito do cinema americano - a gente concorre, e com
ajuda dos distribuidores estrangeiros, mostrando que “o cinema brasileiro
renasceu, e se tornou digno do padrão internacional”. E é a maior festa.
Alguns nomes do cinema brasileiro aderem, talvez cansados… E aí, erro de
cálculo, isso não basta pra desmobilizar o cinema brasileiro. Em vez de
festa é luta.

Esse modelo instaura a paz do cemitério. Ele consagra(ria) uma derrota
definitiva do cinema brasileiro, sua rendição em troca da segurança de uma
pequena elite, e a morte lenta, gradual e segura de toda voz, cineasta e
filme discrepante em favor do modelo comportado do mercado. Concentrando
finalmente o mercado em poucas indústrias estáveis, estabelece e reproduz
outros aspectos do modelo americano, como a primazia do produtor na
realização cinematográfica, e tende a criar e repetir modelos estéticos de
sucesso financeiro, emasculando um dos cinemas mais criativos do mundo.

*O busílis do business*

Mais uma vez, a solução é falaciosa. A questão fulcral do cinema brasileiro
não é nem a produção nem a exibição, embora, claro, passe por esses dois
aspectos importantíssimos. O controle do cinema no nosso país é e sempre foi
exercido pela distribuição, de 1900 até hoje, e até que se tome alguma
providência. Esse modelo segue essencialmente o mesmo, intocado. Se para
certas empresas pode ter surgido uma bela oportunidade de criar uma
subsidiária e faturar algumas boas dezenas de milhões de dólares, para
Hollywood os ponteiros do faturamento não têm oscilação visível, mantendo-se
numa confortável margem percentual que eterniza seu completo domínio do
mercado. E do modelo brasileiro de cinema.

Mas de que serve afinal, identificar na distribuição o problema principal do
cinema brasileiro? Isso ajuda a sair desse círculo maldito de dependência? É
instrumento eficaz para enfrentar o poder de Hollywood?

Quase 100 anos de dominação, acrescidos do poder econômico, militar e da
importância que os EUA dão aos produtos que carregam o american way of life
para os lares dos consumidores de todo o mundo são fortes argumentos
desmobilizadores. A barragem contra a Ancinav é um pálido exemplo da
disposição inicial (a briga nem tinha chegado no Congresso) que têm esses
interesses em manter o status quo no cinema e no audiovisual. Evidentemente,
não há condições de alterar drasticamente essa situação a curto prazo. É um
embate de longa duração que, como também viu o governo – e boa parte dos
governos do mundo - atualmente se inscreve num plano bem mais amplo do
controle social da regulamentação das comunicações e da circulação de bens
culturais.

Mas a constatação da evidência de que o controle do cinema no Brasil é
exercido de fora e através da distribuição, permite ver claramente o modelo
como um todo, ter um plano geral dos limites em que opera a racionalização
desse modelo, que pouco tem variado e que trabalha com uma lógica
determinada. Torna possível pensar em outras perspectivas.

*A origem do modelo atual*

O negócio do cinema é fundamentalmente o mesmo desde a consolidação dos seus
paradigmas, nas duas primeiras décadas do século passado. Vem de então o
design da hegemonia mundial quase absoluta de Hollywood, várias vezes
retocada e atualizada, mas essencialmente alicerçada no mesmo modelo. No
Brasil, que não foge à regra geral, houve, contudo, uma rearticulação
importante nos anos 70, que apenas vem sendo “aperfeiçoada” de lá para cá.

Aquele período sim, foi marcado por uma reestruturação bastante radical na
forma da exploração do cinema no Brasil, com uma espécie de gigantesco
downsizing, de enxugamento ou racionalização de custos em reação à crise
conjuntural importante por que passou o cinema nos EUA imediatamente antes,
nos anos 60, por causa da televisão.

Até então, com uma população grosso modo duas vezes menor que a de hoje, o
Brasil tinha quase três vezes mais cinemas. O ingresso era, há décadas, de 1
dólar em média. O cinema era um divertimento popular, com salas grandes, de
500, 600, 800 lugares, mesmo em cidades relativamente pequenas e, nas
grandes, com cinemas espalhados pelos bairros. O público anual passava da
casa dos 300 milhões de espectadores. Havia muitos exibidores de pequeno
porte e as empresas distribuidoras, quase todas americanas, claro, também
eram muitas. De fato, a competição entre elas criava um espaço de barganha
que permitia a existência dos pequenos exibidores. A estrutura de
distribuição era extensa, as empresas americanas mantinham filiais em
diversos “territórios” de distribuição (só em SP eram 4). Mas tudo isso
representava apenas 2% do faturamento da indústria americana de cinema fora
de seu país, no “estrangeiro”.

Um feio dia, esse modelo mudou. As empresas americanas se concentraram em
apenas três – em alguns momentos só duas – não por processos de aquisição ou
fusão, mas sob a batuta da Motion Pictures Association. Lá, “em casa”, elas
continuavam empresas separadas, aqui se cartelizaram. Os territórios foram
abolidos e fechados os escritórios regionais. Estruturadas como monopólio,
as empresas passaram a ditar os preços sem concorrência: num espaço de tempo
reduzidíssimo faliram aos magotes os pequenos exibidores, desapareceram os
cinemas nas cidades pequenas, depois nas médias, nos bairros… Cerca de 80%
das salas de cinema fecharam em poucos anos.

O modelo e o controle da distribuição determinam o estado da exibição. O
cinema deixou de ser divertimento popular, passou a ser entretenimento para
as elites, concentradas em algumas grandes “praças”, com um ingresso muitas
vezes mais caro do que o valor histórico até então. A administração da
distribuição ficou mais barata e o aumento do ingresso compensou a
diminuição de salas.

Para o Brasil havia sido uma mudança estrutural, o modelo do cinema mudou
completamente, com profundas implicações para a cultura em geral e para o
cinema brasileiro, que encontrava mais público e mais sentido no contato com
um público mais amplo e popular. Segmentos inteiros, gêneros do cinema
brasileiro desapareceram. Apenas para lembrar um exemplo dentre vários, os
filmes que inclusive se pagavam em circuitos “sertanejos”, Teixeirinha,
Mazzaroppi, sumiram. Para Hollywood, contudo, tudo isso praticamente não
mexeu naqueles 2% de faturamento abroad que representávamos para eles.

Alguém logo dirá que muito disso poderia ter acontecido, digamos, no espaço
de 20 anos. Que foi a televisão. Mas, ainda que transpuséssemos esse modelo
de transição mecanicamente para um ritmo muito mais alongado, outros
fenômenos teriam ocorrido, exibidores poderiam procurar se adaptar. Ou
talvez não. Nos Estados Unidos, depois de uma relativamente curta, mas séria
crise no final dos anos 60, o cinema se recuperou e se adaptou, e não parou
de crescer – em faturamento como em número de salas – desde então. Lá ele é
baseado em escala (40 mil salas), aqui em preço (já que somos um pequeno
elemento da própria escala mundial com que opera Hollywwod). Será que aqui
teria havido investimentos para adaptar o cinema às inúmeras mudanças que
ocorreram nestes últimos 30 anos? Ou será que, presos à nossa
insignificância de mercado periférico e sem capacidade própria de
investimento, a situação seria parecida com a de hoje? De qualquer forma, é
preciso abandonar essa platitude ingênua que sustenta que a televisão, o
vídeo e/ou outros gadjets eletrônicos “mataram o cinema”. Justamente nos
países onde tem mais disso tudo, em todos os lares, é que geralmente há mais
cinemas. A começar pelos EUA.

*Modelo de negócio estrangeiro, cinema ocupante*

Entender a formação do modelo do cinema no Brasil possibilita enxergar mais
claramente sua conformação, sua historicidade. Permite entender melhor a que
interesses atende esse tipo de negócio, ver mais claramente sua extensão e,
portanto, vislumbrar seus limites.

É certamente um modelo que não atende às necessidades econômicas do cinema
nacional, pois foi criado como fonte de renda complementar para um produto
que se paga num mercado diametralmente diferente, baseado primeiramente em
um público interno que, ainda por cima, é bastante xenófobo. Hoje, o custo
médio de uma produção estadunidense é de mais de 60 milhões de dólares. É um
modelo de negócio único, que sequer se pratica em qualquer outro país de
renda elevada. É para atender a esse modelo que está estruturado o mercado
brasileiro – e de praticamente o mundo todo: apenas 6 países em todo o
planeta têm seus parques exibidores ocupados majoritariamente por filmes
nacionais, Hollywood ocupa cerca de 85% do mercado mundial de cinema (no
Brasil, três distribuidoras de lá respondem por 85% das bilheterias). Por
isso temos esses preços dos ingressos, a compartimentação da exploração
(janelas), a manutenção de tecnologias superadas (preparando a mudança do
parque de 40 mil salas na matriz), sem falar na repetição infindável de
modelos “estéticos”. A “indústria de cinema” de Hollywood, embora esteja
presente em praticamente todos os países do mundo, não é constituída por
empreendimentos multinacionais: ainda são empresas internacionais. Ou seja,
ao contrário do que se conceitua como empresa multinacional, que admite uma
variável descentralização de decisões, o controle do negócio do cinema ainda
é rigidamente centralizado no famoso bairro de Los Angeles e coordenado por
uma associação corporativa local.

Para atender a esse modelo, no Brasil o cinema atinge menos de 10% da
população (cerca de 15 milhões de espectadores vão ao cinema ao menos uma
vez por ano - fonte: relatório da Warner Bros, 2005). Isso sequer permite a
escala para que a produção nacional se pague no seu mercado: como a produção
recebe cerca de 30% da bilheteria dos filmes, um orçamento de 5 milhões de
reais demanda 2 milhões de espectadores (com o ingresso médio nacional de
2007) para apenas empatar o investimento. Ora, de uma produção anual que
beira 70 títulos de longa metragem, apenas dois ou três, se tanto, a cada
ano, atingem essa marca mínima. E mesmo considerando as produções chamadas
de baixo orçamento, ou cerca de 1 milhão de reais, é preciso um público de
pelo menos 375 mil espectadores. Em 2005, por exemplo, apenas 5 filmes
brasileiros alcançaram esse patamar – embora seja curioso notar que o
campeão de público naquele ano tenha sido Os Dois Filhos de Francisco.

Boa parte da produção brasileira sequer chega aos cinemas (há mais de uma
centena de longas metragens que nunca foram lançados comercialmente), e dos
que chegam, a grande maioria fica abaixo – e com mais freqüência muito
abaixo - de 100 mil espectadores. De fato, daqueles 10% da população que o
cinema em geral atinge, o cinema brasileiro chega a apenas um décimo, ou
seja, talvez menos que 1% dos brasileiros. 60% dos jovens entre 15 e 29 anos
nunca foram ao cinema!

O modelo elitista, que busca apenas o público que pode pagar os ingressos
desproporcionais à renda da quase totalidade de população, produz e estimula
várias outras desigualdades. Apenas 8% dos municípios brasileiros contam com
salas de cinema, e estas estão concentradas em poucos grandes centros: 48%
nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Alguns estados só têm salas de
cinema na capital. No total, isso dá mais ou menos o mesmo número de salas
de cinema que o México, por exemplo, que tem a metade da nossa população. É
verdade que, no auge da crise, chegamos a menos de 1.000 salas; portanto
teria havido um crescimento substancial nos últimos anos. Mas, comparando o
modelo de exibição anterior, com salas de 500, 800 ou mais lugares, e os
atuais conjuntos de salas multiplex, será que houve efetivamente um aumento
na oferta de lugares? Não há estatísticas disso. Mas há sim, outros
indicadores: em 2007, durante várias semanas, apenas dois títulos – e depois
três – de superproduções hollywoodianas, ocuparam entre 75 e 80% de todas as
salas de todo o País.

É, portanto, um modelo que tolhe a manifestação artística do nosso cinema,
mata a possibilidade de expressão da suas enormes diversidades regionais e
emascula sua relação com a grande maioria do público brasileiro, fonte mais
essencial da sua própria inspiração – como de qualquer manifestação
artística. Um modelo que não nos serve, criado para servir a outros
interesses, que não nos beneficiam, pelo contrário. Há que se pensar e
construir outro modelo.

*Falência do arquétipo*

No mercado tradicional, o cinema pouco mudou desde seu surgimento no final
do século XIX. Ainda que tenha recebido incontáveis melhoramentos e
aperfeiçoado incrivelmente sua capacidade de reproduzir ou recriar a
realidade, os fundamentos tecnológicos do cinema mantiveram-se
essencialmente os mesmos, em torno da película cinematográfica. E a
estrutura da cadeia econômica do cinema – produção, distribuição, exibição –
também se manteve basicamente dentro dos mesmos paradigmas. Nesse modelo
centenário, outras instituições relativas ao cinema – o ensino, a
preservação, a circulação sem fins lucrativos - assim como sua sustentação
econômica, igualmente não mudaram no essencial. A mudança fundamental ocorre
com a tecnologia digital e o estabelecimento da rede planetária de
computadores. Só com essa mudança de paradigma todas as etapas do processo
cinematográfico foram essencialmente transformadas: produção,
distribuição/difusão e exibição/consumo.

A estrutura do mercado mundial está em acelerada mudança, e as empresas que
o controlam lutam simultaneamente para manter esse controle e para criar
novas formas e modelos que, assimilando as inovações, possam utilizá-las
para aperfeiçoar esse monopólio audiovisual planetário.

De um lado há sinais evidentes da erosão do modelo, com a criação de novas
formas de compartilhamento das obras cinematográficas, de um mercado mais ou
menos informal de reprodução de filmes, genericamente chamado de pirataria
pela ação de repressão desencadeada pela MPAA em escala planetária. O que é
chamado de pirataria, no entanto, engloba diversas modalidades de difusão e
intercâmbio que não são comerciais e mesmo estritamente privadas. Essa
questão constitui um dos mais importantes litígios internacionais da
atualidade e se desenvolve em torno da questão dos direitos de propriedade
intelectual, no campo das grandes instituições internacionais como a ONU e
suas agências. Mas, concomitantemente, num espaço nebuloso entre legislações
nacionais que ainda não se adequaram às novas questões e ações de força
promovidas pelo grande poder econômico das empresas de entretenimento, uma
enorme campanha mundial se desenvolve contra comerciantes desonestos,
instituições culturais, organizações de ensino e, finalmente, contra os
consumidores privados que acessam produtos culturais sem pagar pedágio aos
controladores de “direitos”, originalmente concebidos para proteção
(justamente contra a exploração das empresas) dos autores desses produtos
culturais. Por outro lado, tal como aconteceu há um século com as inovações
tecnológicas e da comunicação, as empresas buscam sua adaptação ao modelo
comercial e a formatação de produtos para a exploração de mercados definidos
e produção de lucro. Assim surgiram inicialmente as chamadas janelas, que
delimitam mercados (salas de cinema, vídeo caseiro, televisão por assinatura
e televisão aberta) e prazos de exploração comercial.

Mas o avanço da tecnologia e o crescimento de formas alternativas de difusão
e de acesso a esses produtos erodem continuamente os padrões que se tenta
estabelecer. A indústria fonográfica, que tem muito em comum com a do
audiovisual – na questão de controle de mercados, distribuição e retenção da
propriedade – é um exemplo bem mais evidente da falência de mecanismos
“tradicionais” de comercialização.

Esta fase de transformações profundas no próprio modo de produção do cinema,
esta etapa de transição de paradigmas é, igualmente, um tempo de
experimentos e oportunidades.

*Nollywwod*

Um fenômeno que não pode deixar de ser referido é o que está ocorrendo na
África, especialmente a partir da Nigéria. A produção e difusão audiovisual
naquele país se estruturaram em bases diferentes do modelo hollywoodiano e
se tornaram, atualmente, das mais importantes do mundo. Além de sustentar um
modelo econômico muito próprio, o “cinema” nigeriano produziu efeitos
culturais absolutamente inéditos naquele continente abandonado pela
globalização e consumido pelo legado da colonização: despotismo, corrupção,
penúria e doença.

Na África negra, principalmente, praticamente não existe produção de cinema.
Nos herdeiros da colonização francesa, uma produção ocasional, apoiada pela
antiga metrópole, revela esporadicamente talentos importantes, que se
expressam em francês. No restante do continente, nem sequer isso. A Nigéria,
ex-colônia inglesa, não só não produzia cinema como, desde os anos 80, viveu
a desarticulação de seu parque exibidor. O modelo de rentabilidade, mais do
que aqui, não tinha espaço numa economia mais precária que a nossa. A
própria instabilidade do país e a insegurança em Lagos e outras cidades
acelerou o fechamento dos cinemas. Outro fator fundamental para a falência
do modelo de cinema foi, sem dúvida, a grande diferenciação cultural dos
segmentos que compõem a população nigeriana (140 milhões de pessoas) e seu
enorme distanciamento dos padrões estéticos de Hollywwod. Tudo isso
contribuiu para o surgimento de uma produção de narrativas próprias em
vídeo, que paulatinamente foram se organizando num modelo sustentável – e
lucrativo – de produção, distribuição e consumo.

O modelo de “filme nigeriano” é o de uma produção barata (cerca de 25 mil
dólares), filmada em prazos muito curtos e com precariedade de recursos
narrativos. No entanto, desde os anos 80, essa produção foi consolidando sua
base material, acumulando recursos econômicos, técnicos e estéticos.
Integrando o imaginário local e as estruturas sociais e culturais das
maiores etnias nigerianas, esse novo cinema criou uma vigorosa raiz na
cultura popular e construiu um alicerce econômico para o seu
desenvolvimento.

Hoje a Nigéria tem uma indústria de cinema, apelidada de Nollywood, baseada
em tecnologia digital, que coloca o país entre os maiores produtores
mundiais, com mais de mil títulos produzidos anualmente, ou cerca de 30
títulos lançados semanalmente. A distribuição é feita através de lojas e
locadoras – cada filme com uma média de 15.000 cópias, mas alguns chegam à
centena de milhares de DVDs – e de salas de exibição bem simples, onde o
ingresso custa poucas nairas (moeda local). O faturamento aproximado dessa
indústria é de 250 milhões de dólares anuais. E, mais que isso tudo, essa
produção permitiu a expressão de diversas culturas, com um número muito
significativo de filmes falados em iorubá, principalmente, em igbo, hauçá e
em pidgin (patoá nigeriano do inglês), fato inédito e de incomensurável
importância na realidade africana.

Se lembrarmos o número de câmeras a que a juventude brasileira tem acesso, o
vigor das formas de expressão artística – novas ou tradicionais - que vêm
das periferias do mercado formal, e os campos que se abrem, ainda sem
limites visíveis, no terreno da difusão virtual, certamente o modelo de
Nollywood pode nos dar o que pensar...

*Construindo outro(s) paradigma(s)*

No Brasil, as formas não comerciais de produção, distribuição e exibição
também apontam para uma possível superação dos limites impostos pelo modelo
de cinema a que ainda estamos sujeitos. Festivais de cinema, projetos de
exibição itinerante, ambientes na Internet são algumas das formas de
organização dessas iniciativas.

Mas, diferentemente das anteriores, o objetivo dos cineclubes se define pelo
seu enraizamento local, com uma organização ou comunidade, e pela
sistematicidade e permanência de sua ação. Esses objetivos, porém, são muito
relativizados pela fragilidade dos cineclubes, que freqüentemente têm vida
curta. Tradicionalmente pouco reconhecidos nas esferas públicas e menos
ainda nos ambientes comerciais, freqüentemente combatidos pela indústria de
distribuição e exibição, os cineclubes brasileiros praticamente
desapareceram na virada do século. Apenas recentemente o governo federal
começou a esboçar uma política de incentivos à reorganização dessas
entidades, mas os resultados desse estímulo são muito prometedores: já são
cerca de 300 os cineclubes em atividade no Brasil, também presentes em todos
as cantos do País e nos mais diversos meios sociais. Os cineclubes trabalham
fundamentalmente com filmes brasileiros, e marcadamente com o
curta-metragem. O público dessas entidades gira em torno de algumas centenas
de milhares de pessoas por ano, mas o que é mais importante é que elas se
encontram num processo de acentuado crescimento e organização. Como 92% dos
municípios brasileiros não têm salas de cinema, nem tampouco os bairros onde
se concentra a imensa maioria da população – que não vai ao cinema – a
perspectiva de aumento do número de cineclubes é bem clara: eles são as
organizações de caráter permanente possivelmente mais adequadas para
responder à carência de informação, cultura, entretenimento, e de cinema
brasileiro, que grassa na quase totalidade das comunidades brasileiras.

Dentro do movimento de cineclubes surgiu também uma proposta diferenciada de
criação de um sistema, o PopCine, de salas de cinema populares, de baixo
custo de montagem e operação, com uma perspectiva de auto-sustentabilidade
(suscetíveis de se pagarem em cidades menores e outras comunidades urbanas)
e de remuneração de seus colaboradores, assim como dos filmes exibidos. Esse
projeto, no entanto, ainda não conseguiu nenhum apoio efetivo.

A internet, além de já ser uma ferramenta – ou disponibilizar um conjunto de
ferramentas – para a organização de várias atividades internas dos
cineclubes, também representa um instrumento decisivo na evolução do
processo de distribuição, agora difusão, dos conteúdos audiovisuais e,
portanto, da democratização do acesso e da formação do público. A rede
mundial de computadores, e as tecnologias a ela ligadas, não são apenas uma
nova alternativa para o cineclubismo, mas uma nova forma de cineclubismo, a
ser incorporada e desenvolvida com a maior prioridade.